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Cinéfilos Anónimos: outubro 2006

Cinéfilos Anónimos

domingo, outubro 29, 2006

Marie Antoinette - Maria Antonieta


Baseada na biografia de autoria da historiadora britânica Antónia Fraser, a obra recentemente estreada no nosso país, Marie Antoinette – Maria Antonieta por terras lusas – marca o regresso de Sofia Coppola às lides da realização depois dos universalmente aclamados Virgens Suicidas e Lost in Translation.

E se ainda houver quem seja da opinião que o nome, no cartaz, da “menina prodígio” do cinema actual – cuja carreira parece gritar a confirmação do aforismo popular “filho de peixe sabe nadar” – como uma das mais empolgantes e refrescantes cineastas da actualidade, não merece, por si só, toda a expectativa que em sua volta foi criada, talvez o facto de se tratar de uma obra não ficcional que tem como premissa inicial a de oferecer uma visão alternativa e arrojada de uma das mais controversas figuras da história francesa e mundial, os faça mudar de ideias. Mas como não me proponho analisar motivações e pré-reacções, mas a qualidade deste, à partida, promissor Marie Antoinette, reconheço a necessidade de demover as minhas atenções de Sofia Coppola por 123 min. para me focar, só e apenas, na mais recente bandeira que alberga.

Com efeito, Marie Antoinette constitui uma espécie de reconto do percurso de uma das mais mediáticas figuras históricas que, ainda nos dias de hoje, habita no imaginário do povo francês como um símbolo, simultaneamente, das vitórias e retrocessos da Revolução Francesa, ditando e perdendo-se – sem nunca haver a possibilidade de alcançar a resposta definitiva, nem ser esse o seu intuito – nas dicotomias e antíteses que a atribuição do termo abarca: Maria Antonieta foi vítima e causa, esperança e perdição; foi exemplo martirização e frugalidade irresponsável e liberal; e passou de venerada e objecto de admiração, a mal-amada e impopular junto do povo francês…foi, em suma, uma adolescente a quem pediram, cedo demais, que fosse adulta – ou não se desse o facto de que o período temporal sugerido pela narrativa integra o quotidiano da jovem adolescente austríaca recém-chegada a Versailles para desposar Luís XVI (com o intuito de cimentar a aliança entre França e a Áustria), desde os seus quinze anos, vindo a tornar-se rainha aos dezanove, até à sua precoce morte, em 1973, quando tinha 38 anos. Com Kirsten Dunst no papel da protagonista, Sofia Coppola quebra a tradição e retrata a jovem rainha de uma forma inovadora e refrescante, abordando todas as vicissitudes, adversidades e sucessos, sem nunca aprofundar nenhum destes temas – são sugeridos o ambiente hostil e frívolo com que foi recebida na corte francesa; a futilidade dos rituais; a sua resignação e adaptação, que a levaram a conquistar o seu espaço, reinventando uma realidade alternativa tão diferente da sua; as incoerências ideológicas inerentes à posição na realeza; a sua relação com o povo… Todos estes motes tratados como uma simplista sugestão, já que, não obstante da classificação desta película recair sobre o termo “drama histórico”, denota-se um claro intuito de tentar uma abordagem diferente das que até agora temos exemplo – em anteriores adaptações cinematográficas da vida da rainha, o argumento centra-se principalmente na sua fase mais decadente, focando-se nomeada e particularmente no seu romance extra-conjugal com o conde Fersen (também não mais que sugerido neste filme de 2006). Assim, mais do que apresentar um tratado histórica e ideologicamente rigoroso acerca da personalidade – o filme tem erros históricos consideráveis -, e mais ainda do que discernir acerca das motivações e fundamentações do seu declínio, este pretende centrar-se e evidenciar a adolescência conturbada de que aquela foi vítima e confronta (subtilmente e sem se dar a dramas excessivos) a sua imaturidade, fragilidade e uma certa vulnerabilidade com o cargo que se viu obrigada a ocupar, com apenas 19 anos – daí os sapatos, as roupas, os cabelos, as festas e todas as demais extravagâncias serem um vínculo recorrente, quando a mais forte das alusões à revolução propriamente dita se limita a uma multidão enraivecida, de tochas e forquilhas em punho, numa fase já tardia do filme. Em suma, creio que se pode resumir a intencionalidade de Sofia Coppola a partir da afirmação de que este filme pretende desconstruir a imagem de “rainha-má”, os mitos e as distorções de que a vida de Maria Antonieta foi alvo, apresentando uma personagem humana e sofredora, cuja extravagância foi, não só expressão de imaturidade, mas também – e principalmente -, um refúgio das suas frustrações e dificuldades. Aliás, arrisco-me a interpretar o facto de que o filme acaba sem que seja dada qualquer indicação dos acontecimentos que marcaram a sua morte - o final da película limita-se na saída da família real de Versailles, antes de consumada a condenação à guilhotina, a 16 de Outubro – como uma forma de afastar a tentação de se discernir acerca das resoluções, motivações e legitimidade da sua queda, ou, indo um pouco mais longe, discutir acerca da dicotomia causa da revolução ou vítima dela.

Posto isto, o filme começa e acaba – como acabou de ser referido - sem que o seu fatídico destino seja revelado; o debate instala-se e a parca unanimidade é a ordem do dia: a controvérsia da personagem transpõe-se para as reacções da obra correspondente, tendo chegado, até, a ser mal recebido pela crítica generalizada – com direito a trocadilhos textuais de gosto duvidoso e tudo. Acusa, assim e ironicamente, um certo paralelismo com o próprio percurso da personalidade que se propõe narrar: preconceitos ou extravagâncias à parte, é um filme para amar ou odiar. E há, de facto, momentos e aspectos formais e visuais de Marie Antoinette que merecem adoração; como, na mesma conta e medida, há particularidades que o reduzem a uma visão algo irresponsável, simplista e demasiado americanizada do reconhecidamente rico e complexo percurso da rainha protagonista, da sua vida, das suas crenças e motivações.

Assim, se, por um lado, é um facto que a escolha de Kirsten Dunst para protagonista foi uma aposta ganha, sendo que serve grandemente o propósito da realizadora em propor uma visão não tradicional da jovem rainha – colocando uma actriz que é um ícone da cultura teen actual, em virtude das suas participações em filmes como SpiderMan, Wimbledon, etc., e abarcando um risco que acabou por se traduzir em sucesso -, por outro lado, também o é que outros aspectos não o conseguem tão completa e imaculadamente – nomeadamente a sonoplastia, grande impulsionadora de uma referida americanização exagerada e desnecessária da abordagem. Com efeito, embora haja quem defenda que a variedade e a fusão de vários géneros e grupos musicais na banda sonora – cuja disparidade se alarga tão somente de música clássica e essencialmente instrumental (congruente com a época) a música contemporânea, que conta com nomes como The Cure, Aphex Twin, Gang of Four, New Order e outros – contribuem grandemente para a sua versatilidade, creio tornar-se uma mistura desadequada e que compromete, não raras vezes, a verosimilhança e a credibilidade do argumento; serve, à primeira vista, o intuito da realizadora em enfatizar a adolescência da rainha, mas não sem que se deixe rapidamente transformar num rótulo e decair aos pés dos estereótipos – particularmente evidente na cena do Baile de Máscaras, em que a escolha das faixas musicais sugere grandemente – quase obriga – a uma alusão a uma discoteca dos dias de hoje.
Aliás, a escolha das músicas e da protagonista são excelentes exemplos – respectivamente de fracasso e sucesso - daquele que parece ter sido um dos maiores desafios com que a realizadora se defrontou: o doseamento entre a sugestão da euforia adolescente e a seriedade e responsabilidade inerentes à figura e às suas privações, que deveriam ser igualmente evidenciadas.

De notar ainda, relativamente ao elenco escolhido, as participações de Rose Byrne – evidenciando uma mudança muito coerente de registo, desde o seu dramático papel secundário no épico Tróia (como Breseida) para uma das extravagantes amigas da rainha, uma divertida Duquesa de Polignac, cujo espírito livre não lhe permitia a muito apoio na corte -, Molly Shanon -, uma actriz algo sub aproveitada como Tia Victória, uma das afectadas e intriguistas membros da família real – e Judy Davis – como a inflexível Condessa de Noiailles.

Para concluir, resta referir o mais significativo dos elogios e a maior conquista deste filme, que se prende com a cenografia: Versailles é filmado em todo o seu esplendor, não só com as visões do interior – dos móveis imponentes e faustosos à própria indumentária dos participantes, retratada com especial rigor e cuidado, tudo, neste aspecto, parece obrigar que nos deslumbremos -, mas também os longos planos de exterior, que quase nos deixam absorvidos pela dimensão e beleza dos jardins do palácio. Junte-se as vantagens do filme ter sido rodado, de facto, no palácio, original, autêntico e de uma beleza indiscutível, à reconhecida mestria da realizadora no que concerne a enquadramento, fotografia e filmagem, e não será difícil apercebermo-nos de que estamos perante um filme com um aspecto visual feito de pormenores fascinantes e muito bem conseguidos.

Posto isto, a conjugação de todos estes factores resulta num filme, a meu ver, mediano, capaz de desencadear reacções tão díspares que se torna difícil definir quais os aspectos – vitórias ou derrotas – que suplantam e preponderam: se a revigoração de um género, por tradição tão trágico que distante; se a banalização de uma personalidade pela identificação contemporânea exacerbada em detrimento da exactidão factual – quem, à partida, nada sabia sobre a vida de Maria Antonieta, sai da sala da cinema no mesmo ponto em que entrou.


ACDFCONPIQTEAANMCSNHA - 2ª Edição

Nesta segunda edição, com um (gabado) esforço de nos lançarmos ao nível internacional - ou talvez não.


"The voice you hear is not my speaking voice - but my mind's voice. I have not spoken since I was six years old. No one knows why - not even me. My father says it is a dark talent, and the day I take it into my head to stop breathing will be my last.(…) The strange thing is, I don't think myself silent. That is because of my piano."


Ada, The Piano (ler mais no IMDB)



"I asked old Jack: do you remember the night when the sky was so dark and the moon shone so bright, when a million small children pretending to sleep nearly didn’t have Christmas at all, so to speak? And would you, if you could turn that mighty clock back to that long fateful night – now, think carefully Jack – would you do the whole thing all over again, knowing what you know now, knowing what you knew then?

And he smiled like the old pumpkin king that I knew then turned and asked softly of me: "wouldn’t you?""


Nightmare Before Christmas (ler mais no IMDB)



"It's as if Perry and I grew up in the same house. And one day he stood up and went out the back door, while I went out the front."


Truman Capote, Capote (ler mais no IMDB)



"I saw then that my father's only fear was that his son would follow the same road. And that was the last time I ever held a gun. People always thought I grew up on a farm. And I guess, in a way, I did. But I lived a lifetime before that, in those six weeks on the road in the winter of 1931. When people ask me if Michael Sullivan was a good man, or if there was just no good in him at all, I always give the same answer. I just tell them... he was my father."


Michael Sullivan Jr., Road to Perdition (ler mais no IMDB)



"Tell you what, we could've had a good life together! Fuckin' real good life! Had us a place of our own. But you didn't want it, Ennis! So what we got now is Brokeback Mountain! Everything's built on that! That's all we got, boy, fuckin' all. So I hope you know that, even if you don't ever know the rest!"


Jack Twist, Brokeback Mountain (ler mais no IMDB)



"Before he came down here, it never snowed. And afterwards, it did. I don't think it would be snowing now if he weren't still up there. Sometimes you can still catch me dancing in it."


Kim, Edward Scissorhands (ler mais no IMDB)



"Vous au moins vous ne risquez pas d'être un légume, puisque même un artichaut a du coeur"


Amélie, Le Fabulous Destin d’Amélie Poulin




"Mar adentro, mar adentro. Y en la ingravidez del fondo, donde se cumplen los sueños se unen tantas voluntades para cumplir un deseo. Un beso enciende la vida con un relámpago y un trueno. Y en una metamorfosis mi cuerpo no es ya mi cuerpo. Es como penetrar al centro del universo. El abrazo más pueril y el más puro de los besos, hasta vernos reducidos en un único deseo. Tu mirada y mi mirada como un eco repitiendo sin palabras: más adentro, más adentro. Hasta el más allá del todo por la sangre y por los huesos. Pero me despierto siempre, y siempre quiero estar muerto. Para seguir con mi boca enredada en tus cabellos."


Rámon, Mar Adentro




quinta-feira, outubro 26, 2006

Estreias 26/10


O Diabo Veste Prada

Título Original: The Devil Wears Prada
Género: Comédia/ Drama
Realização: David Frankel
Elenco: Meryl Streep; Anne Hathaway; Emily Blunt; Stanley Tucci
Duração: 109 min.

Sinopse do IMDB: “A naive young woman comes to New York and scores a job as the assistant to one of the city's biggest magazine editors, the ruthless and cynical Miranda Priestly.”
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Os Filhos do Homem

Título Original: Children of Men
Género: Thriller; Ficção Científica
Realização: Alfonso Cuáron
Elenco: Julianne Moore; Clive Owen; Michael Caine
Duração: 109 min.

Sinopse do IMDB: “In 2027, in a chaotic world in which humans can no longer procreate, a former activist agrees to help transport a miraculously pregnant woman to a sanctuary at sea, where her child's birth may help scientists save the future of humankind”
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A Prairie Home Companion – Bastidores de Rádio

Título Original: A Prairie Home Companion
Género: Comédia
Realização: Robert Altman
Elenco: Meryl Streep; Woody Harrelson; Tommy Lee Jones; Garrison Keillor; Kevin Klein; Lindsay Lohan; Virginia Madsen; John C. Reilley; Robin Williams
Duração: 105 min.

Sinopse do IMDB: “A look at what goes on backstage during the last broadcast of America's most celebrated radio show, where singing cowboys Dusty and Lefty, a country music siren (Streep), and a host of others hold court.”
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O Último Caçador

Título Original: Le Dernier Trappeur
Género: Documentário
Realização: Nicolas Vanier
Elenco: Norman Winther; May Loo; Alex Van Bibber
Duração: 94 min.

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Vinicius

Título Original: Vinicius
Género: Documentário
Realização: Miguel Faria Jr.
Elenco: Maria Bethânia; Ricardo Blat; Antônio Cândido
Duração: 110 min.

Sinopse do IMDB: “Documentary about Brazilian songwriter and poet Vinicius de Moraes, showing his life, work, family, friends, and love-affairs.”
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Quanto me Amas?

Título Original: Combien tu m’aimes?
Género: Comédia/ Romance
Realização: Bertrand Blier
Elenco: Monica Bellucci; Bernard Campan; Gérard Depardieu; Jean- Pierre Darroussin
Duração: 95 min.

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Com a devida ressalva...
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Fontes:
Cinema PT
IMDB
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...Visitem-nos!

segunda-feira, outubro 23, 2006

The Black Dahlia - A Dália Negra



Baseado no romance de James Ellroy, “A Dália Negra” constitui a adaptação para o cinema de uma história verídica que, até hoje, permanece sem resolução e/ou explicação. De uma forma resumida, a obra conta o violento assassinato de Elizabeth Short (Mia Kirshner) – uma belíssima jovem que sonhava ser actriz, acreditando na “promessa americana” – na década de 40, quando o mundo via despontar nos palcos a mítica Marylin. Contudo, o sonho desvanece e a jovem passa a ser notícia e obsessão pública e policial, não por ver satisfeito o seu ensejo de se tornar uma estrela de Hollywood, mas dado o violento ataque do qual foi vítima. Trata-se de uma história que teria a potencialidade de denunciar a violência, a corrupção, a perversidade, o cinismo e hipocrisia do(s) mundo(s), limitando-se, porém, na minha opinião, a dar-lhe uma imagem igualmente “suja”, já que não parece aproveitar a riqueza das personagens – e o elenco por detrás das mesmas - e o poder da linguagem.

O carácter misterioso (por um lado), tão brutal que quase inacreditável (por outro), o facto de contar com um grande nome do cinema actual no cartaz de realização – Brian de Palma –, bem como o elenco de luxo que gaba exibir, faziam d’ “A Dália Negra” um filme a não perder, semeando e avolumando expectativas elevadas a seu respeito. Como deixo perceber anteriormente, considero que nos é apresentada uma (entre várias possíveis) versão da história sem que a narração tenha o poder de tocar e (muito menos) de transformar o espectador. Visualmente, confrontamo-nos com cenários escuros (congruentes com o contexto), coreografias sangrentas a passos lentos, aconchegados por uma banda sonora sinistra (presságio de dor e distúrbio) e com espaços que parecem ter a capacidade de transmitir odores e sensações de contorcer a cara e o corpo.

A película conta com a realização de Brian de Palma – como, aliás, foi já referido - e orgulha-se de apresentar Josh Hartnett (Bucky Bleichert), Scarlett Johansson (Kay Lake), Aaron Eckhart (Lee Blanchard), Hilary Swank (Madeleine Linscott) e Mia Kirshner (Elizabeth Short) no seu elenco. E, principalmente aqui, devo assinalar alguma (des)ilusão… Tratando-se de actores conceituados e, em alguns casos, galardoados, esperava poder provar da sua qualidade, versatilidade e profissionalismo. Todavia: Josh Hartnett mantém a compleição física (que tendencialmente parece agradar e bastar ao público americano) mas parece descorar a versatilidade, apresentando-se como um polícia “sensível e bonzinho” (que quase confundi com o seu desempenho em Pearl Harbour); Scarlett Johansson e Hilary Swank, inquestionavelmente belas, com percurso nesta arte de referência, apresentam “as suas mulheres” com fraca profundidade psicológica, sendo que, consequentemente, parecem mostrar apenas um fantasma do que poderiam ser e despojar-se do significado e impacto das suas personagens; de referir ainda, acerca da segunda citada, que esta se apresenta num registo diferente do que nos tem habituado nos seus últimos trabalhos – extremamente feminina, sedutora, elegante e atractiva, tendo sido esta uma das particularidades da obra mais “apregoadas” aquando da promoção da mesma em Veneza. Quanto a Aaron Eckhart, talvez por desconhecer outros trabalhos seus, considero-o uma surpresa feliz que, dentro dos limites e trâmites da película, parece ter transmitido emoção e consistência. Mia Kirshner… difícil comentário… talvez a expressão “a bela horrível” traduza o seu desempenho – avaliado, neste sentido, de forma positiva. No entanto, ainda a respeito da participação da actriz, sinto a necessidade de expor o que não passa de uma opinião pessoal: lamentavelmente, transparece uma certa negligência para com a personagem Betty Anne Short, que, não obstante de ser à volta desta que todas as outras histórias tomam lugar, não deixa de ser sugerida apenas como um pretexto para o resto da trama, e não mais do que isso. Posto isto, vemos a “Dália” ser relegada para segundo plano (quando deveria ser o foco da história) já que tem um espaço na narrativa que se quer menor.
Por fim, oferecendo a ênfase merecida à análise de interacções entre as personagens acima citadas, estas constituem, a meu ver, o mais premente fracasso da obra, sendo que a decaláge entre a maturidade exigida pela complexidade das personagens e a, de facto, consumada pelos jovens actores questiona irremediavelmente a verosimilhança do argumento. O que acabo de expor é particularmente evidente na relação triangular (quadrangular? ou mais simplesmente múltipla?) entre as figuras centrais da trama – Lee, Bucky e Kay –, em que passamos – abrupta e frugalmente – de uma interdependência “saudável” e equilibradamente alimentada por valores como a cumplicidade característica do companheirismo, para uma paixão hollywoodesca e reprimida, pela falência de um dos vértices da relação.

Gostaria, ainda, de deixar uma palavra acerca da adaptação do argumento, no que diz respeito ao texto. Porque a arte é comummente considerada complexa e erudita, muitos são os que parecem negligenciar a simplicidade em favor do método, da técnica, do belo… do indecifrável e do incompreensível! Relativamente aos diálogos, fica a sensação de estarmos constantemente perante saltos ilícitos de raciocínio que se configuram num discurso lacunar e pouco apelativo – não só obrigando o espectador a esforços de compreensão, como também, e por esta mesma razão, não o prendem ao enredo.

Em jeito de conclusão, após ter lido diversos comentários com o mesmo intuito que este e ter analisado os diferentes “rótulos” que vão estando associados ao filme, poderia dizer que posso considerá-lo um policial – pela acção e conteúdo – mas nunca um drama – pela precária profundidade do argumento, pelos inexistentes espaços de reflexão estruturados e pela difícil capacidade de ser indiferente.



domingo, outubro 22, 2006

ACDFCONPIQTEAANMCSNHA - oh my god...

Já ouviram dizer que há palavras que valem mais que mil imagens?... Não?!

Ok, talvez não; mas vamos tentar convencer-vos do contrário, num segmento que gostamos de chamar - e passaremos a implementar, semanalmente - "Aquelas Citações Daquele Filme-Clássico-Ou-Nem-Por-Isso Que Teimam Em Agarrar-se À Nossa Mente Como Se Não Houvesse Amanhã".

Sem mais delongas, aqui ficam as ditas citações inaugurais:


“To make a fighter you gotta strip them down to bare wood: you can't just tell 'em to forget everything you know if you gotta make 'em forget even their bones... make 'em so tired they only listen to you, only hear your voice, only do what you say and nothing else... show 'em how to keep their balance and take it away from the other guy... how to generate momentum off their right toe and how to flex your knees when you fire a jab... how to fight backin' up so that the other guy doesn't want to come after you. Then you gotta show 'em all over again. Over and over and over... till they think they're born that way.”

- Eddie, Million Dollar Baby (ler mais (IMDB))

If I were thinking clearly, Leonard, I would tell you that I wrestle alone in the dark, in the deep dark, and that only I can know. Only I can understand my condition. You live with the threat, you tell me you live with the threat of my extinction. Leonard, I live with it too.”
- Virgínia Woolf, The Hours (ler mais (IMDB))


"We are told to remember the idea, not the man, because a man can fail. He can be caught, he can be killed and forgotten, but 400 years later, an idea can still change the world. I've witnessed first hand the power of ideas, I've seen people kill in the name of them, and die defending them... but you cannot kiss an idea, cannot touch it, or hold it... ideas do not bleed, they do not feel pain, they do not love... And it is not an idea that I miss, it is a man... A man that made me remember the Fifth of November. A man that I will never forget."

- V, V for Vendetta (ler mais (IMDB))

"The man who said "I'd rather be lucky than good" saw deeply into life. People are afraid to face how great a part of life is dependent on luck. It's scary to think so much is out of one's control. There are moments in a match when the ball hits the top of the net, and for a split second, it can either go forward or fall back. With a litte luck, it goes forward, and you win. Or maybe it doesn't, and you lose."

- Chris, Match Point (ler mais (IMDB))

"I was 27 years old the first time I died."

- Jack Starks, The Jacket (ler mais (IMDB))

"Roxie: You're, THE Velma Kelly. I was there the night you got arrested.
Velma Kelly: Yeah? You and half of Chicago. "

Chicago, ler mais (IMDB)

Ponto de Situação - a Ressurreição

Como devem ter já reparado, esta humilde casa tem permanecido em estado vegetativo, no mais profundo e doloroso coma, nos últimos tempos – cinco (5) meses, em nome do rigor e da ética. De reparar também, em virtude do demonstrado nos últimos dois (2) posts, que – em boa verdade da velha máxima “a esperança é a última a morrer” – renasce em nós um desejo revigorado de continuar a partilhar – independentemente da dimensão das redes de suporte social que constituem um importante contributo no que se refere ao reconhecimento do que aqui se publica… mas que, infelizmente, escasseiam.
Devaneios à parte – e passando para assuntos bem mais prementes – expomos aqui a acta da nossa última RGDCA (Reunião Geral Dos Cinéfilos Anónimos), para vos dar a conhecer os destinos que por elas foram ditados.
Após um balanço e avaliação do que se tem feito até agora – e dos respectivos resultados -, pensamos servir melhor os nossos e vossos interesses, versatilizando e diversificando a que tem vindo a ser a nossa conduta ao nível dos conteúdos deste blogue.
Com efeito, pensamos publicar mais frequentemente textos mais curtos, dando também espaço e enfoque a outros tipos de media – nomeadamente, imagens, vídeos, músicas -; conteúdos de carácter lúdico; ou ainda propor o debate, a partir da contextualização social de alguns filmes, personagens, épocas ou acontecimentos que o justifiquem.

Concluindo, expressamos aqui a nossa disponibilidade e desejo de que se sintam à vontade de participar e expressar os vossos pensamentos e opiniões acerca destas resoluções, doutros conteúdos que gostariam de ver aqui representados, comentar, ou simplesmente denunciar o abuso do vosso tempo que os autores deste espacinho praticam, praticaram e praticarão, enquanto houver quem nos “leia”.

Saudações Cinéfilas!
a equipa

Cinderella Man

O filme de Ron Howard que estreou as salas de cinema no ano de 2005 – Cinderella Man – parece só ter sido alvo da avaliação de madrastas e padrastos. Digo-o pelo pendor marcadamente negativo que se pode ler acerca da película – que se adivinha intimamente relacionado com a atitude do protagonista (Russel Crowe) fora dos ecrãs e que a reduz ao rótulo de cliché.

Passado no final da década de 20, o filme conta a história de James Braddock (Russell Crowe). Apresentado em pleno auge da sua carreira, o prestigiado e promissor boxeur, marido e pai exemplar, depara-se com dificuldades multideterminadas (de natureza social e desportiva) que culminam na progressiva degradação económica, pessoal e familiar. Vendo agravada uma lesão, em pleno crash da bolsa (1929), o pugilista vê fugir-lhe a sua sorte, continuando a lutar, desta feita, para alimentar e manter unida a sua família, vendo-se obrigado a trabalhar nas docas de Nova Iorque. Paralelamente às dificuldades oferecidas a esta família, assiste-se à precária condição social da nação, sendo que Braddock parece apresentar-se como uma a via do renascimento para ambos: a vitória de um homem, a esperança de um povo.

Tratando-se da narração de uma história de vida, aceito a opinião que defende a previsibilidade do argumento e a ausência de “fantásticas” surpresas. Contudo, a redescoberta de valores como a honestidade e a família, a reflexão em torno da educação, do sofrimento, do trabalho bem como a análise histórica que vai permitindo, com fidelidade, paralelamente à trama, far-me-iam tirar perante si o meu chapéu se o usasse, pelo que me limito ao que posso: a lisonjeá-lo e a transmitir a minha admiração a todos quantos quiserem ouvir. Não me considerando espectadora de lágrima fácil, frente a tamanhas dignidade, coragem, força e integridade, não posso deixar de sentir-me (e perdoem a linguagem tão corrente que simplória) pequenina!

Dando, finalmente, lugar a uma análise de cariz mais formal, salvaguarda-se a qualidade do desempenho de Russell Crowe – transmitindo eximiamente a emoção, sensibilidade e profundidade de um lutador (na vida e no desporto); contudo, o actor mantém o registo ao qual nos habituou, deixando apetecer alguma diversidade e versatilidade –, de Renée Zellweger – imagem da elegância e da simplicidade, da mulher e da mãe, da humildade e da coragem, numa performance incriticável – e de Paul Giamatti – condimentando a película com o humor que lhe é característico e que faz dele um dos melhores actores da actualidade no género. Notifica-se, ainda, o mérito da adaptação de uma história verídica para o grande ecrã, por parte dos argumentistas e do realizador Ron Howard. O trabalho por estes levado a cabo, traduzido nesta obra Cinderella Man, permite a todos nós (re)conhecer uma personalidade que nos enriquece pela sua humanidade e pela relevância do seu percurso.

Com o intuito de “aguçar o apetite”, deixo-vos este trailler.

Diários de Che Guevara - Motorcycle Diaries

Che Guevara – o nome tem força e vida próprias e move multidões… envia-me imediatamente para a imagem de um rebelde, de um inconformado, de um homem do povo em férrea defesa de uma causa, de um ideal.

O convite para desfrutar destes diários chega por parte do meu interesse pela beleza da paisagem que a premissa de uma viagem deixa adivinhar e não do senhor da política cubana (?). Todavia, as minhas expectativas saíram claramente defraudadas. Não porque as paisagens não merecessem a repetição da viagem na primeira pessoa mas antes porque a personalidade ganhava progressivamente mais força, mais humanidade!

Na década de 50, dois jovens argentinos – Ernesto Guevara (Bernal) e Alberto (Serna) – implementam uma viagem, por eles significativa e investidamente planeada e sonhada, pela América Latina. O finalista de medicina e o bioquímico, respectivamente, propõem-se fazê-lo (e fazem-no) a bordo “de la poderosa” (a motocicleta de Alberto). O caminho é longo, o objectivo auspicioso e, embora os críticos revelem uma reflexão primeiramente politica, eu atrevo-me a considerá-la, para além disso, ética e humana.

Ouso afirmar que a viagem ultrapassa o conceito que banalmente utilizámos, deixando provar diferentes significados da doença, da dignidade, da igualdade, da humildade… Dissecar os motivos que me levam a considerá-lo um dos meus filmes de eleição, roubar-vos-ia a magia da construção do vosso próprio significado. Resta salientar as belíssimas interpretações dos protagonistas – Bernal e Serna –, a força da banda sonora (premiada, aliás, pela Academia e de autoria do consagrado Gustavo Santaolalla) e o valor do testemunho real de Alberto (companheiro e amigo de Che Guevara nesta viagem e na vida).