Arte em Série(s)
Se é verdade que, há uns anos, as séries televisivas eram tidas como uma “arte” menor comparativamente ao cinema, também o é temos vindo a assistir ao processo de crescimento, reconhecimento e afirmação das séries no panorama actual. Cada vez mais frequentemente: (1) nos deparamos com argumentos mais complexos e/ou melhor articulados (dos mais perspicazes em termos da crítica social, passando por uma comédia inteligente e audaz e/ou pela ficção científica questionante e reflexiva, chegando aos dramas mais realistas), (2) se torna claro que a necessidade de fidelização do público ajudou a definir a ficção para televisão como um género em que vale a pena apostar/investir; (3) assistimos a uma maior “permeabilidade” entre o mundo televisivo e o do cinema, nomeadamente tendo em conta a participação de reconhecidas caras do cinema em séries televisivas (e vice-versa), o que, há uns anos, era tido como (quase) desprestigiante.
A título de exemplo, quanto este ultimo ponto, podem ressaltar-se os casos do realizador Quentin Tarantino (responsável pelo episódio final da série CSI) ou da galardoada com um Óscar em 2008 pelo argumento do filme Juno, Diablo Cody que se estreou recentemente na televisão com a série United States of Tara.
Assumindo-me, igualmente, como uma fã recente de séries, proponho-me a fazer um breve comentário a algumas das minhas séries de eleição:
How I met your mother (Foi assim que aconteceu)
Um humor descontraído e a aparente simplicidade inerente aos relacionamentos entre amigos são os ingredientes principais desta série (que já vai na 4.ª temporada) que se organiza em torno da revelação do início da história de amor dos pais, narrada pelo pai aos filhos. Com efeito, são contados pormenorizadamente, os momentos mais marcantes da vida de cinco amigos – Ted, Lilly, Marshal, Robin e Barney – vividos em conjunto. Assumindo o ridículo, cada personagem denuncia as preocupações e sentimentos do nosso quotidiano. Será este um alerta que nos convida a procurar o humor que existe nos nossos gestos mais pequenos ou, sem qualquer pretensão, apenas um incentivo a desfrutarmos de 20 minutos de total despreocupação? Efectivamente, a série assume-se enquanto puro entretenimento, não parecendo ter qualquer preocupação de ordem social, nem o intuito de “educar” o público. Trata-se, desta forma, de uma série acerca de “nada” (aproximando-se do formato apresentado por Seinfeld), cuja continuidade é garantida pela constante expectativa de, finalmente, conhecermos a identidade da mãe dos filhos do narrador.
Grey’s Anatomy (Anatomia de Grey)
Toma a Medicina como pretexto, mas serve-se dos relacionamentos e dos dilemas das personagens para atrair a nossa atenção e reflexão. Uma comédia dramática (atrevo-me a chamar-lhe assim) que disseca em torno das implicações que a nossa personalidade pode ter no nosso trabalho (ou será, acerca do modo como a nossa profissão pode moldar aquilo que somos, com base naquilo que vivemos), do processo de comunicação humana (quantas vezes revelamos o nosso amor através da agressividade? Ou quantas vezes o escondemos com indiferença para não demonstrar vulnerabilidade?) e do significado da vida (ou do amor na nossa vida?)… A escolha dos protagonistas (Meredith e Derek) deixa muito a desejar (tamanha é a inexpressividade), mas deparamo-nos com personagens extremamente fortes e ricas.
Lost (Perdidos)
Tendo iniciado, na quarta-feira, a sua 5.ª temporada na América, Lost centra-se numa história envolta num clima de total mistério. Após o despenhamento do avião no qual viajavam, os sobreviventes vêem-se obrigados a viver numa ilha, aparentemente impossível de localizar. O processo de socialização e de sobrevivência é descrito de uma forma vivencial, podendo o realismo sair comprometido pela forte componente de ficção científica que a série encerra.
Brothers & Sisters (Irmãos e Irmãs)
De uma forma concreta e aparentemente simplista, trata-se de uma história acerca de uma família. Afirmo-o, acreditando que nenhum relacionamento (muito menos, no que diz respeito à vivência diária de uma família nuclear) é linear ou descomprometido. Enquadrada num contexto claramente americano, são também abordadas questões políticas e sociais da máxima relevância (não só declarando a controvérsia, como assumindo posições e, desta forma, provocando um desequilíbrio questionante junto do espectador). Na sua 3.ª temporada, Brothers & Sisters leva-nos a revisitar as nossas concepções de família e a nossa própria vivência dos laços, favorecendo a adopção de uma posição crítica, mas proactiva em relação a nós próprios e “aos nossos” – tudo isto, abrilhantado pelo humor presente nos diálogos e pelo carácter especial e único de cada personagem.
Six Feet Under (Sete Palmos de Terra)
Foi numa postura resistente que comecei a seguir esta série. Falar da morte ou enfrentar o medo não é propriamente convidativo, ou é-o para poucos. Acresce a este facto, o da série ter o poder de, não só desmistificar a morte e os nossos receios de perda, como de extrapolar o tema num esforço de valorização da vida! Incontável e inesgotável num parágrafo, a série encerra em si um potencial reflexivo e profundamente transformador.
Muitas outras há por referenciar (não o faço por desconhecimento), pelo que deixo os desafios:
Que estilo mais vos atrai?
Que séries acompanham e porquê?